O Observatório das Ciências e das Tecnologias (OCT) tem vindo a desenvolver
instrumentos de observação da situação profissional de ex-bolseiros de
doutoramento da FCT, com o objectivo de identificar os seus percursos profissionais
e diagnosticar eventuais bloqueios à sua inserção no mercado de trabalho. Tem
vindo, deste modo, a ser criado um sistema permanente de recolha e análise de
informação sobre a situação profissional dos ex-bolseiros de doutoramento.
O primeiro inquérito aos ex-bolseiros de doutoramento foi lançado em 1996,
no quadro da avaliação global do Programa CIENCIA. O segundo inquérito foi
aplicado em 1998, abrangendo os indivíduos que terminaram bolsas entre o início
de 1990 e Outubro de 1998. O terceiro inquérito destinou-se aos ex-bolseiros
que terminaram bolsas entre Novembro de 1998 e Dezembro de 1999. O quarto
inquérito, em 2001, incidiu sobre os ex-bolseiros cujas bolsas de doutoramento
terminaram em 2000.
Neste relatório analisam-se, de uma forma breve, os três inquéritos mais
actuais. O segundo inquérito considerou 1.949 indivíduos e obteve 1.771 respostas,
o terceiro 560 indivíduos e 490 respostas, o quarto 406 indivíduos e 339
respostas.
Uma parte dos ex-bolseiros ainda prosseguia os estudos de doutoramento em
exclusividade: 7%, 15% e 18%, respectivamente para o 2º, 3º e 4º inquéritos.
Uma vez que os inquéritos consideraram bolseiros que tinham terminado as bolsas
recentemente e que as bolsas de doutoramento são concedidas para o máximo de
quatro anos, é natural que haja bolseiros que não terminaram o doutoramento até
ao fim da bolsa. Por outro lado, o facto do valor do 2º inquérito ser
significativamente inferior ao dos outros dois é facilmente explicável por
aquele inquérito ter considerado bolsas que terminaram num período muito mais
alargado (cerca de 106, 14 e 12 meses, respectivamente no 2º, 3º e 4º
inquéritos).
Aproximadamente 10% dos ex-bolseiros considerados em cada um dos inquéritos
prosseguia formação de pós-doutoramento.
Declararam não estarem a exercer qualquer actividade, respectivamente, 2%,
4% e 7% dos inquiridos em cada um dos inquéritos, valores que são baixos, tanto
mais que parte dos inquiridos tinham terminado as bolsas há menos de seis meses
e alguns aguardavam a realização de provas de doutoramento.
A maioria dos ex-bolseiros de doutoramento a exercerem actividades, desenvolve-as
em Portugal (87%, 83% e 81%, respectivamente no 2º, 3º e 4º inquéritos).
Verifica-se um aumento da fracção de ex-bolseiros em actividade no estrangeiro,
embora estes valores não sejam surpreendentes, dado que, respectivamente, 17%,
25% e 28% dos inquiridos ainda prosseguia estudos de doutoramento ou
pós-doutoramento e, além dos aspectos já apontados, há recentemente uma maior
incidência de bolsas de doutoramento no estrangeiro. Cerca de 75% dos
ex-bolseiros em actividade no estrangeiro realizavam-na em universidades ou
instituições de investigação, o que também está associado ao número de
ex-bolseiros que ainda prosseguem estudos de doutoramento ou pós-doutoramento.
As distribuições das situações profissionais dos ex-bolseiros antes de obterem
as bolsas de doutoramento e na altura dos inquéritos (no 3º e 4º inquéritos
entre seis meses e um ano após terminada a bolsa, no 2º inquérito até 9 anos
após terminada a bolsa) são dadas nas Figuras 3.1, 3.2 e 3.3.
Figura 3.1 - Nº de ex-bolseiros de doutoramento inquiridos por tipo de situação
profissional, antes da bolsa e na altura do inquérito – dados do 2º inquérito
(bolsas terminadas em 1990-98, inquérito realizado em 1999) (1) (Fonte: OCT)
(1) O pós-doutorandos e os doutorandos em exclusividade são contados em
Investigadores.
As Figuras 3.1 a 3.3 permitem tirar várias conclusões sobre o emprego de
ex-bolseiros de doutoramento:
· Verifica-se um
aumento para cerca do dobro de inserções profissionais de ex-bolseiros, de antes
para depois das bolsas;
· O emprego como docente do ensino superior é maioritário,
embora a fracção dos ex-bolseiros que são docentes do ensino superior tenha
diminuído, baixando para metade do total no último inquérito;
· As situações em que se verifica um maior aumento de
empregabilidade ex-bolseiros, de antes para depois das bolsas, são de docente
do ensino superior (tanto público como privado, como não universitário),
investigador e cargos directivos de gestão ou assessoria;
· Verifica-se uma
visível absorção de ex-bolseiros de doutoramento pelo ensino universitário
particular e pelo ensino superior não universitário, o que corresponde a uma
situação nova no país;
· As funções técnicas superiores, assessores e consultoria
demonstram uma considerável atractibilidade de ex-bolseiros de doutoramento;
· Para docentes do ensino secundário a bolsa de
doutoramento abre oportunidades para outras situações profissionais, o que se
foi acentuando mais recentemente.
Em conjunto, os resultados dos inquéritos indicam uma situação equilibrada relativamente à inserção profissional de doutorados, continuando a observar-se uma elevada capacidade de absorção de doutorados no país, como seria de esperar dado o elevado deficit de investigadores em Portugal relativamente à média europeia (a fracção de investigadores na população activa é cerca de 60% da que se observa para toda a UE).
Figura 3.2 - Nº de ex-bolseiros de
doutoramento inquiridos por tipo
de situação profissional,
antes da bolsa e na altura do inquérito – dados
do 3º inquérito (bolsas
terminadas em Nov.98-Dez.99, inquérito realizado
em 2000) (1) (Fonte: OCT)
(1) O pós-doutorandos e os doutorandos em exclusividade são contados em
Investigadores.
Desde 1987, o
número de doutorados a trabalhar no país mais do que quadriplicou. Contudo,
para atingir a média europeia é praticamente necessária uma nova duplicação de
doutorados.
A inserção profissional dos novos doutorados tem decorrido de forma
natural, especialmente em instituições do ensino superior. Na verdade, houve um
período considerável em que uma grande parte dos novos doutorados tinham
vínculos laborais com universidades ainda antes de obterem os doutoramentos,
pelo que a absorção de novos doutorados era praticamente automática.
Em Portugal, a grande maioria dos doutorados são professores universitários.
Verifica-se, contudo, que os docentes universitários dispõem de pouco tempo de
qualidade para actividades de investigação, estando frequentemente
sobrecarregados com tarefas docentes e administrativas. Este facto foi repetidamente
apontado pelos painéis de avaliação internacionais das instituições de
investigação como sendo uma das principais debilidades do Sistema de Ciência e
Tecnologia Nacional.
Figura 3.3 - Nº de ex-bolseiros de
doutoramento inquiridos por tipo
de situação profissional,
antes da bolsa e na altura do inquérito – dados
do 4º inquérito (bolsas
terminadas em 2000, inquérito realizado em 2001)
(1) (Fonte: OCT)
(1) O pós-doutorandos e os doutorandos em exclusividade são contados em
Investigadores.
Apesar do deficit de doutorados e
da naturalidade da inserção profissional de novos doutorados que se tem
verificado, corroborada também pela baixa procura de bolsas de pós-doutoramento
por portugueses (há menos de 200 bolseiros de pós-doutoramento portugueses no
país apesar das aprovações de candidatos a este tipo de bolsas, que se
encontram abertas em permanência, serem da ordem de 85% das candidaturas), há
razões de preocupação relativamente ao emprego de doutorados no futuro
imediato.
Foi, aliás, devido a esta preocupação que foi criada a linha de
financiamento da FCT de Estímulo à Inserção Profissional de Doutorados em
Empresas e em Instituições de I&D.
As linhas de apoio da FCT às instituições de investigação também prevêem
meios financeiros para a contratação de investigadores doutorados, embora a
intenção principal da atribuição destes financiamentos seja reforçar,
qualificar, rejuvenescer e expandir com investigadores a tempo inteiro, essas
instituições de investigação. Neste contexto, são particularmente significativos
os apoios aos Laboratórios Associados (cf. PARTE
III – INSTITUIÇÕES deste relatório).
São duas as razões principais de preocupação com o emprego de doutorados no
país:
1) Os países da europa central, incluindo os grandes países
(Alemanha, França e Reino Unido) estão a entrar num período de previsivelmente
elevado recrutamento de doutorados, devido à vaga de aposentações de
investigadores e docentes universitários contratados em número elevado nas
décadas que se seguiram à II Guerra Mundial. Estes países têm enfrentado
dificuldades em atrair para carreiras científicas novos investigadores e,
portanto, é claro que haverá um esforço organizado de recrutamento de
doutorados de outros países. Pela primeira vez, estaremos numa situação em que
a expansão de doutorados em Portugal coincide com uma elevada procura de
doutorados nos países mais avançados europeus, o que constituirá um enorme
desafio à capacidade de atracção de investigadores doutorados para Portugal.
2) As universidades portuguesas têm estado praticamente
passivas em matéria de recrutamento de doutorados e têm revelado falta de agilidade
para reacções rápidas às mudanças que se verificam externamente. Nem mesmo se
observa interesse efectivo das universidades no desenvolvimento da carreira de
investigação no seu seio, o que se afigura como um passo óbvio para promover o
rejuvenescimento de quadros, a disponibilidade de recursos humanos para a
investigação científica e tecnológica e a competitividade científica no âmbito
nacional e internacional.
Pelas razões indicadas, é imprescindível prosseguir com uma política de estímulo ao emprego científico e promover a criação de quadros de investigadores doutorados para terem funções nas instituições de investigação científica e tecnológica. Se não se revelar exequível a rápida criação destes quadros nas universidades, será provavelmente necessário criar um quadro central para este tipo de recursos humanos, e fomentar a sua actividade nas instituições de investigação mais qualificadas e a sua mobilidade.