PROFESSOR BARGANTE, OPINIÃO TUNANTE, ASSUNTO DISTANTE

Em artigo do Espaço Público da edição de 11 de Abril, Vital Moreira (VM) refere-se ao Instituto Superior Técnico como uma "universidade bargante" (ruim, de maus costumes, libertina, devassa) a propósito da polémica que esta escola mantém com a tutela sobre o seu subfinanciamento.

VM faz um diagnóstico (a meu ver correcto) de muitos dos problemas das instituições de ensino superior e da incapacidade da tutela e das próprias instituições em avançarem com reformas na sua gestão. O excesso de pessoal, a multiplicação de cursos sem procura, a aventura de pólos e extensões, a falta de métodos elementares de gestão financeira e contabilística, etc., são tudos problemas que observadores mais ou menos atentos também são capazes de reconhecer. O problema está no único exemplo que foi capaz de encontrar: o Técnico.

A opinião tunante de VM com a tutela sobre o IST, e que parece afinar também na badalada fórmula de financiamento, não podia estar mais distante das raízes do problema. Senão vejamos algumas notas musicais sobre o Técnico:

- Não tem polos ou extensões;

- Não tem cursos sem procura;

- Gere-se por principios de contabilidade analítica (foi a primeira instituição pública a adoptá-los);

- Realiza auditorias externas às suas contas.

É que não tendo a escola uma gestão exemplar, estes assuntos estão de facto distantes de qualquer justificação para o apelidado "buraco financeiro" da escola.

Então se a gestão é razoável a pergunta legítima é: porquê que a escola atravessa problemas financeiros? A reposta é simplesmente uma: subfinanciamento. Os responsáveis pela escola teimam em manter-se fieis à sua missão de "promoção de um ensino superior de excelência e qualidade nas áreas de Engenharia, Ciência e Tecnologia", mas nisso não parecem ser acompanhados pelos responsáveis da tutela. A fórmula de financiamento resolve o problema político de distribuir as verbas pelos vários estabelecimentos de ensino superior, mas não resolve o problema de criar em Portugal escolas de qualidade internacional e bem organizadas (paradoxalmente, as duas palavras chave no discurso oficial dos responsáveis pela Educação).

A ideia de que todas as universidades devem ser tratadas por igual é uma miragem que só existe em Portugal. Nos EUA, nos vários milhares de instituições de ensino superior existentes, não mais de uma centena são "research universities". Os orçamentos destas universidades são dispares. A Universidade de Stanford ou o Massachussets Institute of Technology (instituições com um número de alunos semelhante ao do Técnico) tem cada uma orçamentos anuais superiores ao orçamento que a Secretaria de Estado do Ensino Superior distribui anualmente, pela mais de uma dúzia de universidades públicas portuguesas. Este orçamento vai, quando muito, aumentar ao ritmo do PIB e por isso a sua distribuição devia ser feita de forma mais responsável ,distinguindo as instituições que têm, consistentemente, demonstrado melhor qualidade. A prazo, deveria existir uma clara distinção entre "research universities" e as restantes.

Em Portugal mais de trezentos mil alunos de licenciatura e dez mil alunos de pós-graduação frequentam as universidades públicas e privadas. O número total de alunos no Técnico é pouco mais de nove mil, dos quais cerca de mil são alunos de pós-graduação. Nas "research institutions" americanas, como as duas que referi acima, é vulgar que o número de alunos de graduação e de pós-graduação sejam aproximadamente iguais. Acresce que em Portugal o número de doutorados per capita é ainda inferior a metade da média europeia. Seria natural que uma escola como o Técnico apostasse ainda mais na formação de pós-graduação. Se a forma "equatitativa" de financiamento do ensino público se mantiver, e se as instituições forem incapazes de atrair outros financiamentos, esta aposta não vai ser possível e o atraso científico do país vai manter-se.

 

Rui Loja Fernandes

Professor Auxiliar

Departamento de Matemática, Instituto Superior Técnico

rfern@math.ist.utl.pt

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